terça-feira, 9 de junho de 2015

Sobre A Máquina do Mundo:

1.
A 11 de setembro de 2001, dois aviões colidiram com duas torres em Nova York.
Este é um facto. Isto é verdade. A verdade é o que está na realidade a acontecer, é o incidente propriamente dito.
2.
Porquê dois aviões colidiram com duas torres em Nova York a 11 de setembro de 2001?
O ponto de interrogação no final da última frase e a palavra inicial "porquê" demonstram que a verdade e o facto, da primeira declaração, exigem um esclarecimento, se se quiser verdadeiramente responder à pergunta baseado em factos.
Onde ocorre a palavra "porquê", a verdade e os factos desaparecem, porque a questão "porquê algo acontece" leva à confusão à obscuridade.
A palavra "porquê" não tem a ver nem com a verdade nem com os factos. Nunca pertence ao incidente em si.
Daí que, o facto e a sua interpretação são fundamentalmente diferentes um do outro.
Todavia, o facto de a 11 de setembro de 2001 dois aviões colidirem com duas torres foi (ou mais precisamente: foi, imediatamente a seguir) interpretado como um impacto de ações de terroristas islâmicos.
A palavra "porquê" pertence à humanidade, não a factos e à verdade.
Um "porquê" é geralmente seguido por uma resposta e uma interpretação, respetivamente.
E imediatamente o mundo é explicado.
Mas o que há para ser explicado?
Assim, a seguir ao "porquê" seguem-se interpretações, uma vez que a humanidade as forneça. Uma vez que os governos as forneçam.
Para interpretar algo que todos podem interpretar.
A palavra "porquê" pertence à fraqueza humana. Com ela, qualquer intérprete e qualquer governo pode operar bem. Como interpretações - e não só aquelas que sirvam os interesses dos governos - que nada têm a ver com a verdade, especialmente nada com a perceção da verdade e dos factos de cada um dos seres humanos.
O ser humano individual não sabe o porquê de algo acontecer. A causa pode estar no facto de que alguém possa já ter escrito sobre o assunto ou pintado um quadro. A causa pode ser qualquer uma.
A causa é desconhecida para o homem, o que ele – mais dificilmente – esquece, é quando as interpretações são dadas.
No entanto, as interpretações são dadas de forma pouco clara no que toca ao significado, tanto nos termos utilizados assim como na interpretação per se. No caso de 11 de setembro de 2001, que está explicado como sendo um impacto das ações de terroristas islâmicos, a esta interpretação falta a definição dos termos "terrorismo" e "Islão". Mas tal definição é necessária para descobrir ambos, o desconhecido e o nome do desconhecido.
Contudo, o que tem o desconhecido a ver com as interpretações humanas e com os termos?
No espetáculo de Alexej Schipenko,  MACHINA do Mundo, o desconhecido aparece como um homem chamado Camões, que afirma que ele deveria ter tomado posse de outro avião em 11 de Setembro de 2001, mas que desistiu dessa intenção enquanto estava ainda sentado no avião. Um Camões de quem nunca ouvimos falar.
E em 2024 este Camões desconhecido dirá: “Há vinte e três anos eu ia no quinto avião e... esse avião  devia entrar pelo gabinete do Djordsch Dabbel Ju Busch ... mas não entrou. .. éramos três ...reconsiderámos ... É tão porreiro-comprar um bilhete para o Porto e passar neste paraíso vinte e três anos de felicidade clínica’ .

Uma história que ninguém conhece. O segredo de um incidente cujas causas são desconhecidas.
Alexej Schipenko 
autor Alexej Schipenko | encenação Alexej Schipenko | assistentes de encenação João dias e Leon Langhoff | elenco António Jorge, André Laires, Carlos Feio, Frederico Bustorff, Jaime Monsanto, João Chelo, Rogério Boane, Rui Madeira, Solange Sá, Sílvia Brito e Vicente Magalhães | espaço cénico e figurinos Alexej Schipenko | ambiente sonoro Pedro Pinto | desenho de luz Fred Rompante | operador de luz Vicente Magalhães | criação vídeo Pedro Alpoim | design gráfico e fotografia Paulo Nogueira